segunda-feira, 27 de junho de 2011

Estratégia

Entrevista com o economista Thiago Curado: "Varejo repassará alta de custos ao consumidor sem grandes problemas"

Mas as decisões tomadas pelo governo têm reduzido as chances de uma inflação crescente e preocupante? Em que o governo tem acertado e o que tem deixado de fazer?
Em boa parte, o cenário ruim da inflação observado atualmente é decorrência de uma interrupção prematura, em agosto de 2010, do ciclo de aperto monetário. A atual rodada de elevação das taxas de juros terá impacto no segundo semestre de 2011, quando deverá contribuir para controlar a alta de preços. Todavia, entendemos que o ritmo de aperto monetário é insuficiente para trazer a inflação de volta ao centro da meta em 2012, além de permitir riscos elevados de estouro da meta de inflação este ano.

O preço das commodities começa a ceder. Podemos esperar preços que pressionem menos a inflação?
Sim, os maiores impactos da valorização de commodities foram concentrados no último trimestre de 2010 e nos primeiros três meses de 2011. A partir de agora, deverão exercer menos impactos sobre os preços.

O consumo continuará aquecido? Que segmentos devem perder vendas? Quais devem se manter nos mesmos níveis ou crescer?
O consumo deverá continuar aquecido, mas perdendo ritmo no segundo semestre, especialmente por conta do aperto monetário em curso pelo Banco Central. Todavia, os reajustes salariais têm se mostrado particularmente elevados este ano, devendo, no segundo semestre, funcionar como alavancadores de demanda na economia, impedindo uma desaceleração mais clara do consumo e tornando mais difícil o combate à inflação.

A indexação já é visível em serviços. Corremos o risco de o mesmo acontecer com outros setores da economia? O que governo e empresas precisam fazer para evitar o ciclo antecipado de reajustes?
Hoje, a indexação no Brasil é restrita a serviços e a preços administrados (preços controlados, cujo aumento depende diretamente da inflação passada. Caso de energia, água, esgoto). De acordo com nossos estudos, 41% dos componentes do IPCA têm algum grau de indexação, formal ou informalmente. Logicamente, todos os produtores tentam repassar aos seus produtos aumentos do nível geral de preços. É o que acontece com bens de consumo. Mas não se trata de indexação e, sim, de um comportamento natural da formação de preços de qualquer economia.
A agenda de desindexação da economia brasileira é tão importante quanto complicada, em função da resistência dos agentes econômicos em abrir mão de mecanismos pré-estabelecidos. De toda forma, um ponto importante que poderia contribuir para reduzir a indexação seria alongar os prazos de reajustes de tarifas administradas – que hoje ocorre anualmente. Além disso, deveríamos extinguir o IGP-M como indexador de contratos de preços monitorados. Este índice reflete principalmente os preços de atacado, cujas altas acabam sendo repassadas ao consumidor final.

Corre-se o risco de os supermercados serem considerados vilões da estabilidade econômica como ocorreu na época de hiperinflação? Que responsabilidade os supermercados têm na contenção de preços?
Os supermercados, como qualquer outro agente econômico, tentam repassar aos seus consumidores aumentos de seus custos. Dessa forma, na medida em que tanto os bens de consumo como os custos de seus funcionários se elevem, a tendência é de um aumento de preços ao consumidor. O quanto desse percentual de aumento de custos é repassado para os consumidores depende fundamentalmente de condições de oferta e demanda. Mas, no cenário atual, com consumo tão pressionado e desemprego bastante reduzido, a tendência é que os supermercados consigam repassar quase integralmente esses aumentos de custos, sem com isso serem chamados de vilões.

O reajuste de salários, sobretudo no segundo semestre, tenderá a exercer pressão sobre a inflação? A escassez de mão de obra observada em inúmeros setores da economia será um fator de pressão sobre salários e inflação?
De fato, o principal fator que nos causa preocupação no cenário de inflação do segundo semestre é a questão salarial. Os reajustes têm se mostrado particularmente elevados este ano, devendo, no segundo semestre, funcionar como uma injeção de demanda na economia, impedindo uma desaceleração do consumo e dificultando o combate à inflação. Pelo lado dos custos, também deverá provocar uma maior persistência da inflação de serviços.

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